terça-feira, 3 de março de 2009

IMPRESSÕES BASCAS

O PEQUENO BASCO

Abriu muito lentamente a janela, apenas o suficiente para conseguir passar a mão. Já com a mão de fora deixa deslizar pela parede até á rua o pau da bandeira. Fecha a janela inspirando devagar como se isso o fizesse mais silencioso. Não conseguiu deixar de esboçar um pequeno sorriso. A bandeira dobrou-a meticulosamente até que coubesse no unico bolso disponível do saco que tinha a tiracolo. Entrou na sala já de casaco e gorro insuspeitos. A mulher estava de pé com o filho ao colo a pôr-lhe um ultimo agasalho. Sorriam. Sorriu-lhes. " Está pronto? ". Mais umas luvas e mais um " não te esqueças de prendê-lo sempre ao carrinho" depois e " sim, está pronto. Mas aonde vão vocês afinal? ".- "Dar uma volta só" e o sorrisinho a vir por aí fora a crescer por dentro. Era melhor sair já.
Desceram até á rua e viraram para a direita de modo a passar pela janela de onde a mulher dizia adeus e gritava um ultimo cuidado. Acenou de volta, segurou o sorriso, deu a volta para as traseiras do prédio, olhou para os lados, apanhou o pau de bandeira, olhou outra vez á volta e depois para dentro do carrinho onde estava o filho e soltou finalmente o sorriso.
Dali foram directos para o Casco Viejo, a bandeira ainda na mala, o pau ainda inutil, só prometedor. Ainda uma paragem. Calle Perro. Boinas Elosegui. A primeira boina, há muito encomendada. " Agora sim " e os olhos rasos de água. Lá vão eles "calle" abaixo até chegar a Ribera. Começa a ouvir-se o burburinho incitado dos comicios politicos. Param a menos de 100 metros do primeiro aglomerado de pessoas. Abre o saco, tira a bandeira, desembrulha-a, enfia-a no pau. Descansa-a no ombro e com a outra mão empurra o carrinho do filho até uma zona com menos gente. Enquanto se gritam palavras de ordem permanece,silencioso, de bandeira encostada ao ombro, de sorriso posto e o seu pequeno basco ali de boina nova a coleccionar memórias.
Regressam. Todo um processo. Ir ás traseiras deixar o pau. Embrulhar a bandeira e guardá-la agora no casaco. Dar uma volta ainda maior pela rua de trás para parecer que vinham do parque caso a mulher estivesse á espera já na janela. - " Então onde foram? Demoraram ". Não responde está a esconder a bandeira á pressa. A mulher tira o filho do carrinho. Estava tudo bem. Agasalhos, luvas, preso ao carrinho com o cinto e... aquela boina. O pequeno basco com a pequena boina.Sorriu. Ele viu-a sorrir. Ela percebeu. Afinal aquilo não era politica. Era ternura.