sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

NA FÁBRICA
Na fábrica vive um mundo inteiro. Vivem olhos, todos. Vivem suspiros e resignações. Vivem sonhos. Ignorâncias. Vivem alguns audazes. Mãos hábeis, gestos mecânicos. Ombros e seus vários pesos. Pequenas mortes. Desencontros ternos. Dias seguintes. Fins de tarde recortados em janelas. Chuvas inteiras ampliadas nos zincos. Ausências. Regressos. Cumplicidades. Gente, muita gente. Gente inteira de pestanas tristes. Enfileirados. De tantas sortes. De alguns azares. Com uma vida inteira por viver. Uns com tempo, outros não. Gente dali. Gente daqui mesmo. Olhas para uma fila. São quatro. São muitos mais. O mais novo ainda tem esperança nos olhos. Cara franzida a fintar o destino. O de trás já sabe como é mas ainda acredita que saber como é serve para alguma coisa. A primeira senhora descobre todos os dias o mesmo e por breves momentos as mãos desistem e pousam no regaço. A jovem senhora atrás sofre ainda de um revés amoroso. Está ausente.
Na fábrica vive a vida inteira de um pequeno mundo.


Um comentário:

  1. Pois é, vidas ausentes. Ausência de criatividade, morte da liberdade. A esperança é a última a morrer... mas a humanidade está ainda cheia de esperança. Vem aí o Novo Mundo, o mundo onde todas as pessoas serão todas finalmente gente.

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